Entrevista por André Luiz & Sara Ferrer – Imagens por Raphael Rangel & divulgação – Edição por André Luiz
Considerando que a banda foi formada apenas em 2012, podemos dizer que os potiguares do Far From Alaska alcançaram uma abrangência de respeito, seja pelos eventos e grandes festivais dos quais participou brasil – e mundo – afora, a recomendação de Shirley Manson vocal do Garbage, a ótima receptividade de público e crítica ao seu debut álbum ‘modeHuman’ e a singles como “Chills”, parcerias com outros nomes da nova safra do rock nacional como Scalene e Supercombo, ou mesmo a recente premiação em Cannes como artista revelação.
Atualmente radicados em São Paulo – por questões logísticas – e em pré-produção do novo trabalho de estúdio, o Portal Metal Revolution em conversa exclusiva com Cris Botarelli e Emilly Barreto em vias da apresentação da FFA na abertura do show do Garbage na capital paulistana, e as meninas deixaram o recado: “é validação gringa que precisa pra se reconhecer a volta do rock no Brasil como um gênero que está apto qualitativamente para o grande público? Então, está aí, já temos”.
Equipe MR – Os integrantes são veteranos da cena, porém a banda é relativamente nova, tendo nascido como um duo de teclado e voz entre Emilly e Cris nos idos de 2012. Como surgiu a ideia de montar o Far From Alaska e como se deu a escolha deste nome?
Cris Botarelli – Primeiro é legal dizer quem em Natal montar banda é meio que um hobbie – todos tínhamos várias antes de nos mudarmos. Em segundo lugar, pelo óbvio: a Emmily canta muito bem, era um desperdício tê-la somente na bateria como era no Talma & Gadelha e decidimos começar esse projeto novo. A escolha do nome foi através da mãe da Emmily que fez uma listinha com várias opções de nomes envolvendo a palavra “Alaska” que era uma das únicas que curtíamos em conjunto.
Equipe MR – Hoje em dia a internet é um dos principais meios de divulgação de bandas – principalmente as iniciantes. Muitas saíram da internet para o “mundo real”, mas vocês conseguiram uma ‘ajudinha’ de peso para entrar nos holofotes após Shirley Manson – vocalista do Garbage – conhecer o trabalho do FFA. Como se deu este contato e, em vias de reencontrá-la como banda de abertura do show do Garbage em São Paulo, quais as expectativas para este reencontro?
Cris Botarelli – Nos cruzamos no lobby do hotel no dia do Terra, batemos um papo e tiramos fotos. Já prevendo que ela nunca lembraria de nós (e como não tínhamos nem cd físico para entregar pra ela), eu decidi acordar cedinho no dia seguinte e esperá-la lá embaixo pra entregar um bilhetinho falando de como havia sido significativo para gente aquele encontro e lembrando-a do nome da banda. Aí o resto é história: meses depois acordamos com um post na página oficial do Garbage sobre a gente! Foi demais! No dia do show aqui a gente espera ter oportunidade de conversar de novo, bater papo, contar o que rolou com a gente depois do post dela, enfim. Foi um longo caminho até aqui, espero que role!
Equipe MR – DoSol, Planeta Terra Festival, Lollapalooza, Festival SXSW (Austin, EUA), Maximus Festival, Porão do Rock, e em vias de se apresentar no Festival Rolling Stones Brasil – além da citada abertura para o Garbage… Em meio ao currículo extenso de apresentações em importantes eventos da Far From Alaska, há algum em especial o qual vocês possam destacar? A experiência de dividir o palco/backstage com importantes nomes da cena brasileira/mundial agrega em quais pontos para vocês como músico/pessoa?
Cris Botarelli – Difícil escolher um, viu? Eu acho que destaco o show do Midem em Cannes, na França, um dia antes de ganharmos o prêmio “We Are The Future” lá, pela experiência como um todo. Muito surreal estar ali tocando pra tanta gente importante do music business mundial… Nem com muita imaginação a gente conseguiria prever que o rock nos levaria pra lá! Sobre dividir backstage e palco, poxa, sempre muito legal, como se pode imaginar, sempre bom encontrar outras bandas, trocar experiências e celebrar a música juntos, em geral, porque é nessas oportunidades que a gente consegue ver o show das bandas amigas: geralmente as agendas são todas malucas e isso não é possível.
Equipe MR – Falando na premiação, recentemente a FFA conquistou prêmio na categoria “We Are The Future” (artista revelação) durante a 1ª edição do International Midem Awards, em Cannes (FRA). Comentem sobre o sentimento dos integrantes da banda por receber esta honraria.
Cris Botarelli – Não tem como descrever, é uma sensação de “QUE?” misturada com uma alegria gigante de perceber que o mundo está de olhos abertos pra o que está acontecendo aqui no Brasil também, talvez até mais que nosso próprio país e sua eterna síndrome de vira-lata. É validação gringa que precisa pra se reconhecer a volta do rock no Brasil como um gênero que está apto qualitativamente para o grande público? Então, está aí, já temos, está acontecendo! E aqui não poderia deixar de citar o Scalene e seu Grammy latino por ‘Éter’, o discasso deles! 🙂
Equipe MR – No primeiro semestre foi lançado o single “Chills” nas principais plataformas digitais, e em novembro foi anunciada a pré-produção do sucessor de ‘modeHuman’. Como estão os processos de gravação deste novo trabalho de estúdio, quem está envolvido neste e qual a previsão de lançamento?
Cris Botarelli – Ainda estamos no período de pré-produção entre nós, não iniciamos as gravações. Estamos bem imersos nesse processo de compor e não poderíamos estar mais empolgados com o que virá por aí! Ainda não temos data pra lançamento, mas o certo é que será lançado já na primeira metade de 2017.
Equipe MR – ‘modeHuman’ trouxe um conceito da relação homem x máquina em sua arte, já a capa de “Chills” traz a ilustração de duas tesouras… Comente sobre a letra de “Chills” e o conceito da arte de capa.
Emilly Barreto – A letra de “Chills” é sobre o reencontro de duas pessoas que já tiveram um caso amoroso que não acabou bem. Uma das partes obviamente ainda sente atração pela outra e meio que a música toda narra um joguinho de “quero, mas não quero”. A duas tesouras na ilustração representam essas duas pessoas.
Equipe MR – A Far From Alaska lançou “Relentless Game” e “Surrendo” em parceria com as bandas Scalene e Supercombo respectivamente. Como se deram os contatos com estes grupos? A amizade/proximidade entre nomes da nova safra da música brasileira – ao menos no que tange aos integrantes da FFA – é uma constante ou são raros os casos?
Cris Botarelli – Nos cruzamos em festivais ao longo da nossa história e ficamos amigos. É uma constante sim no FFA, um costume que trouxemos de casa: em Natal todas as bandas se conhecem, fazem coisas juntos (inclusive outras bandas, rs), não importa o estilo. Foi muito natural tentarmos repetir esse comportamento quando nos mudamos pra São Paulo e tem trazido ótimos frutos pra todo mundo.
Equipe MR – A FFA é uma banda que não cabe apenas sobre o rótulo de stoner rock devido à pluralidade do som apresentado pelo conjunto em suas composições. Quanto ao processo de composição, a inserção de elementos diferentes foi algo pensado ou surgiu naturalmente? Como é o processo de criação e composição de vocês?
Cris Botarelli – É tudo muito natural, nada foi pensado. Quando convidamos os meninos pra banda, a gente só disse que seria uma banda pra Emmily cantar e nada mais. Nos juntamos em estúdio e as coisas foram acontecendo. Todos participam muito, é um processo muito difícil por esse motivo. Todos os arranjos têm que passar pelo crivo de todos. No primeiro disco, as composições foram feitas todas em estúdio. Já no segundo, o processo está um pouco diferente, eu e o Raffa trabalhamos muitas “intenções de canção” em casa e levamos pro estúdio a ideia aberta pra trabalharmos todos juntos, que é o que realmente faz com que o Far From Alaska seja o Far From Alaska.
Equipe MR – Emilly e Cris começaram a tocar na Igreja. Hoje em dia a intolerância religiosa é um dos temas mais abordados. Vocês sofreram algum tipo de preconceito no começo, quando decidiram montar uma banda fora da igreja? Como foi a infância de vocês? As famílias são muito religiosas até hoje?
Cris Botarelli – Inicialmente é preciso dizer que a igreja cristã evangélica em geral é um meio muito convidativo para pessoas que querem aprender música. Inclusive, meninos e meninas são estimulados igualmente a aprenderem a tocar instrumentos musicais desde a infância, o que é muito legal. Eu, particularmente, nasci em berço presbiteriano, uma denominação muito antiga, surgida logo após a reforma protestante, e por isso, muito tradicional. É uma igreja conhecida pela moderação dos seus membros, pessoas mais esclarecidas, muito estudo, então: não, nenhum preconceito. Nossas famílias continuam frequentando a igreja e eu também, sempre que posso. Inclusive, eu tocava na igreja até 2014, quando me mudei pra São Paulo; todos lá conhecem (e curtem muito) minha banda.
Equipe MR – Muito se fala de machismo dentro do rock, mas fato seja dito, as mulheres conquistaram bastante espaço e a participação nesse meio só tem aumentado. Vocês já sofreram algum tipo de preconceito neste sentido?
Cris Botarelli – Eu ía responder “não”, mas na verdade sim. É engraçado como a gente se acostuma com situações machistas pelo fato de termos convivido com elas a vida inteira. Recentemente gravei com a Natália Noronha, do Plutão Já Foi Planeta, uma versão de “Tempo Perdido” para o projeto Viva Renato Russo, lançado em outubro desse ano. Produzimos e gravamos todos os instrumentos, mas sempre que mostrávamos pras pessoas (inclusive pros amigos) percebíamos uma dificuldade de assimilar que havíamos feito tudo sozinhas. Todos, sem exceção, perguntaram “mas quem gravou?”, “o Raffa colocou guitarras?” “ah, vocês gravaram? mas quem fez o arranjo? quem produziu?” Inconscientemente todo mundo procurou o “homem por trás”. Isso é machismo. Se qualquer músico homem tivesse declarado “produzi esse som”, ninguém questionaria, é óbvio. São essas coisinhas que fazem a gente perceber que ainda há muito caminho pra se percorrer nesse sentido. E, claro, também que será maravilhoso percorrê-lo.
Equipe MR – Emilly e Cris deixaram a banda Talma & Gadelha ao final de 2013, após o lançamento do elogiado álbum ‘Maiô’, devido à dificuldade de manter duas bandas simultaneamente – conforme anunciado à época. Três anos após, como vocês observam esta decisão e quais frutos trouxeram para a atividade da FFA? Reencontraram a Talma & Gadelha e seus integrantes na estrada durante este período?
Cris Botarelli – Foi muito triste ter que sair do Talma & Gadelha, que além de contar com dois dos compositores que mais admiro no Brasil, era muito divertido! As viagens, as conversas… Temos muita saudade de tudo e de todos, mas foi inevitável, estávamos atrapalhando mais que somando, porque desde o começo do Far From Alaska, as coisas se concentraram sempre mais aqui no sudeste. Sim, quando estamos em Natal nos encontramos, somos amigos e todos eles moram no nosso coração.
Equipe MR – Levando-se em conta a mudança da banda para São Paulo por questões logísticas, como tem sido a adaptação dos integrantes a esta nova realidade? Os integrantes permanecem com atividades paralelas a música?
Cris Botarelli – Não, largamos nossas vidas paralelas. Entre nós tem desde advogada (a que vos fala), até arquiteto, diretor de arte, programador… E tem sido deliciosamente difícil. Não temos um conforto financeiro equivalente à quando seguíamos nossas outras profissões, mas por outro lado estamos realizando um sonho, um projeto de vida que, até agora, tá dando super certo! É muito legal isso, somos abençoados por estarmos conseguindo viver de música, apesar das dificuldades.
Equipe MR – Por fim, muito obrigado pela entrevista, deixe uma mensagem aos fãs da banda.
Cris Botarelli – Oi pessoas que curtem o Far From Alaska! Da onde cês são? Quais são as bandas iradas da sua cidade? Já procurou saber? Apoiem a cena local, conheçam bandas novas, frequentem shows, façam o role crescer! Ah, e espero esbarrar com vocês por aí pelo Brasil, beijinho pra todo mundo!
Agradecimentos à Costábile Jr. – The Ultimate Music – e Izabela Costa – Inker Agencia Cultural – pelo contato para realização desta entrevista.