Texto por André Luiz – Fotos por Júlio Szoke – Edição por André Luiz
O projeto cultural HonorSounds em parceria com a produtora Dynamo Brazilie reuniu no palco do Tropical Butantã em São Paulo as bandas holandesas VUUR e Delain. A renomada vocalista Anneke van Giersbergen (The Gathering, The Gentle Storm, Devin Townsend Project, Danny Cavanagh, Ayreon) retornou ao país trazendo pela primeira vez sua banda, para divulgar o álbum ‘In This Moment We Are Free – Cities’ de 2017. Já o Delain, liderado pelo ex-Within Temptation Martijn Westerholt e a carismática Charlotte Wessels, lançaram há poucos meses o EP ‘Hunter’s Moon’ e retornam menos de um ano após apresentação com o Nightwish em São Paulo. A abertura ficou a cargo das bandas Van Dorte, BrightStorm e Living Shields.
Clima frio e garoa típica da capital paulistana, a casa fora aberta por volta dàs 19h e logo na sequência a primeira das três vencedoras do concurso “Minha banda com a Dynamo” subiu ao palco. A banda de Araçatuba Living Shields, ainda para um pequeno público, apresentou quatro faixas de seu EP ‘Delirium’: a destaque lançada em vídeo clipe “Painful Fate”, mais “Beyond The Cry”, “Candle Light” e a derradeira “Empty Search”. Poucos minutos depois já com um público maior, Naimi Stephanie (vocal), Alexis Nunes (bateria), Will Lopes (guitarra), Edy Silva (baixo) e Gabriel Bernardes (teclado) trouxeram a BrightStorm, de São José dos Campos ao palco do Tropical Butantã. Divulgando o álbum de 2017 ‘Through The Gates’, os destaques ficaram para as faixas de entrada e término do repertório “Intro/Psicostasia” – Naimi e sua vestimenta “capa dourada” estilo asas – e “Vampire”, singles lançados nas plataformas digitais em forma de vídeos, em um set também composto por “Two Steps” e “No More To Lose”.
A terceira e última performance de abertura ficou a cargo dos paulistanos da Van Dorte. Promovendo o disco de 2017 ‘Epilogue’, o set list fora composto de faixas como “Claustrophobia” e “In The Dark” intercaladas com o single de 2013 “So Weak”; o destaque imediato ficou para a presença de palco e sonoridade clara dos instrumentos do trio formado por Alexandre Carmo (guitarra), Bru Paraffine (baixo) e Vandré Sculler (bateria). A partir do último single do full lenght de 2017, “Fragile Dreams”, foi possível ouvir de maneira mais clara a sonoridade do teclado de Dione Rigamonti e da guitarra de Will Oliveira (guitarra), um diferencial nítido na execução do estilo pós-punk do grupo liderado pelo frontman Feleex Duarte, cujo encerramento contou com o baixo ditando o ritmo em “Evil Side” às 20h47m. De uma forma geral, trata-se complicado julgar a qualidade de um grupo em meio a 3-4 músicas executadas e a correria para montagem/desmontagem/ajuste de instrumental, talvez a diminuição do número de bandas de aberturas fosse o mais adequado tendo em vista que se tratava de uma noite com dois headliners – a diferença da quantidade de público do início da primeira para o final da última apresentação de abertura era gritante –, ou que o evento fosse promovido realmente como um festival, tendo tais bandas mais tempo de show.
Alguns minutos após o programado, às 21h03m, os PA’s iniciaram uma “Intro” para alvoroço do público – o qual ocupava no dado momento cerca de 80% da pista premium e 50% da pista normal, contingente bem maior do que na abertura da casa. Ao adentrar dos músicos, a execução de “Go Away” do ‘April Rain’ de 2009 fez o Tropical Butantã explodir na aparição de Charlotte e seu vestido laranja, arrancando brados estridentes da plateia ao banguear a longa cabeleira loira. Interativa, a frontwoman pronunciou seu primeiro “obrigada” da noite em bom português e iniciou acompanhada dos teclados de Martijn Westerholt “Masters Of Destiny”, do mais recente EP ‘Hunter’s Moon’, hipnotizando os presentes.
“Boa noite São Paulo, como vocês estão? Estamos muito felizes por voltar aqui, é maravilhoso” discursou Charlotte antes de “The Glory And The Scum”, emendada com “Suckerpunch” – ambas do ‘Moonbathers’ de 2016 –, contando com público vibrante fazendo backing vocal durante toda faixa e atuação esplendorosa da vocal holandesa. Uma introdução no teclado foi acompanhada por palmas do público regidas pela frontwoman na dobradinha formada pelas canções “Fire With Fire” e “Get The Devil Out Of Me” – respectivamente do ‘Moonbathers’ de 2016 e ‘We Are the Others’ de 2012 –; já com a luz amarela dando o tom do ambiente, “The Monarch / Hands Of Gold” – outra do disco de 2016, a qual originalmente contou com participação de Alissa White-Gluz do Arch Enemy – empolgou a banda devido a reação energética do público na casa de shows paulistana.
A banda de metal sinfônico holandesa foi formada por Martijn Westerholt em 2002, um ano após sair do Within Temptation ao descobrir que sofria da doença de Pfeiffer. Inicialmente tratado como um projeto solo, a situação mudou quando o tecladista conheceu – por acaso – a até então desconhecida vocalista Charlotte Wessels, o pontapé inicial para uma parceira de mais de uma década. Contando na line up com Otto Schimmelpenninck van der Oije (baixo), Timo Somers (guitarra) e Joey de Boer (bateria) – a guitarrista Merel Bechtold não veio para América Latina devido compromissos com a banda Mayan –, além dos já citados Martijn e Charlotte, o Delain aportou no Brasil em meio a divulgação do EP ‘Hunter’s Moon’, lançado no dia 22 de fevereiro – seu último full lenght foi o ‘Moonbathers’ de 2016. Se em estúdio a sonoridade sinfônica da banda nos arremete ao lirismo do gótico, a presença de palco e carisma naturais dos músicos dão autenticidade às apresentações ao vivo dos holandeses. E desta forma, Wessels primeiramente dirigiu-se a plateia pedindo que “na próxima faixa gostaria da ajuda de vocês gritando” antes de “Sing To Me” – do ‘The Human Contradiction’ de 2014, a qual originalmente contou com participação de Marco Hietala do Nightwish – e seguiu pulando, cantando, incitando os presentes: a frontwoman deu a tônica da alegre música impulsionando a presença do público em forma de coral e palmas.
Os músicos deixaram o palco, exceto Timo Somers e Joey de Boer os quais proporcionaram divertida jam no palco, demonstrando a precisão/energia na bateria da Delain e a técnica/virtuosismo na guitarra roxa de 7 cordas. Charlotte retornou ao palco com sua voz doce contrastando com o scream de Otto Schimmelpenninck van der Oije durante a execução de “Pristine” – ‘Lucidity’ de 2006 –, em destaque novamente a frontwoman bangueando e incitando o público enquanto o baixista cantava sua parte na faixa. A intro instrumental “Intermission” e “Mother Machine” – duo do ‘We Are the Others’ de 2012 – despejaram energia no palco do Tropical Butantã sendo acompanhada em uníssono pelos presentes, enfatizando o trio Wessels/Oije/Somers bangueando e o domínio de voz da mezzo soprano variando de tons mais altos a suaves com naturalidade. Ao fim, Martijn Westerholt veio a frente do palco para aplausos gerais, gritos de “Delain Delain” ecoaram na casa de shows e após agradecimentos efusivos de Charlotte, o anúncio de “Don’t Let Go” – ‘The Human Contradiction’ de 2014 – regado a mãos no alto ao ritmo do teclado de Martijn, público pulando e músicos bangueando.
“Esta é sobre vocês e para vocês” discursou a vocal de 32 anos – completados na semana do show em São Paulo, exatamente na segunda-feira, dia 13 – anunciando a faixa título do álbum de 2012 “We Are The Others”, com presentes vibrando insandecidamente, pulando e bradando o refrão junto a frontwoman. “Muito obrigado, vocês são demais” bradou Wessels em meio aos gritos do público, pedindo na sequência para ouvir a todos – sendo prontamente atendida – e anunciando a faixa que nomeia o EP recém lançado “Hunter’s Moon”. A menção da vocal holandesa à faixa derradeira da apresentação – “The Gathering”, do ‘Lucidity’ de 2006 – foi muito bem recebida pelos presentes, os quais pularam e aplaudiram em meio ao backing vocal de Somers e o espetáculo de interpretação final de Charlotte no palco. OS PA’s executavam um “Outro” às 22h14m, enquanto os integrantes da banda agradeciam a todos – incluindo o baterista com camiseta da seleção brasileira de futebol – e muita vibração pôde ser sentida durante a última interação entre músicos e público. A Delain demonstrou claramente como um grupo pode sobrepujar seu bom material de estúdio com uma performance ao vivo impecável, elevando os holandeses a outro patamar. A resposta da plateia foi instantânea, tanto do maciço fã clube presente quanto de pessoas as quais desconheciam o trabalho de Charlotte e companhia, inclusive tecendo comentários elogiosos sobre a espantosa atuação da banda ao vivo.
Set List Delain:
Intro / Go Away
Masters Of Destiny
The Glory And The Scum
Suckerpunch
Fire With Fire / Get The Devil Out Of Me
The Monarch / Hands Of Gold
Sing To Me
Timo & Joey Jam
Pristine
Intermission / Mother Machine
Don’t Let Go
We Are The Others
Hunter’s Moon
The Gathering
Os roadies trabalharam a todo vapor – inclusive alguns dos equipamentos foram retirados/montados pelos próprios instrumentistas dos headliners da noite –, até que às 22h34m os músicos da VUUR surgiram no palco feito furacão em uma energética introdução instrumental, até a entrada de Anneke para “Time – Rotterdam” do debut ‘In This Moment We Are Free – Cities’ de 2017 – primeiro acertando o microfone e depois nos brindando com a potência de sua voz. “São Paulo, como vocês estão? Isso é lindo, vamos lá” interagiu a vocal antes da primeira faixa da clássica banda The Gathering ser executada, “On Most Surfaces (Inuït)” do ‘Nighttime Birds’ de 1997, contando com teclado característico no playback e músicos de cordas demonstrando presença de palco impactante pulando de um lado para o outro. “Vocês são incríveis (pausa para notar um fã acenando da pista), óh eu amo você também, e este som se chama…” discursou a frontwoman anunciando “My Champion – Berlin”.
Reconhecida como vocalista da fase mais marcante da banda holandesa The Gathering, Anneke van Giersbergen solidificou sua carreira solo através de projetos como o Aqua de Anique, The Sirens com as vocalistas Liv Kristine e Kari Rueslatten, The Gentle Storm ao lado de Arjen Anthony Lucassen – com quem também excursionou pelo projeto Ayreon –, vários discos gravados com Devin Townsend, tour com Danny Cavanagh do Anathema, entre outros. A VUUR surgiu de uma necessidade da cantora em demonstrar seus traços mais pessoais – nas palavras da própria, “eu quero que o meu lado mais pesado na música seja realmente pesado, e minha música acústica suave ser quase silenciosa e interna” – ao lado de alguns dos melhores instrumentistas da Holanda: Ed Warby (ex-Ayreon, The Gentle Storm na bateria), Jord Otto (ex-ReVamp na guitarra), Ferry Duijsens (Anneke van Giersbergen, The Gentle Storm, The Sirens na guitarra) e Johan van Stratum (ex-Stream Of Passion, The Gentle Storm no baixo). Até o momento, a banda lançou apenas o álbum ‘In This Moment We Are Free – Cities’ de 2017. Com o extenso currículo de projetos e apresentações no Brasil da holandesa – em São Paulo ela pode ser quase que considerada uma residente devido suas constantes apresentações na cidade –, o mero anuncio da faixa “The Storm” do projeto The Gentle Storm – presente no álbum ‘The Diary’ de 2015 – fora comemorada efusivamente pelos presentes, os quais acompanharam na base das palmas a execução da já considerada clássica faixa.
A feição de divertimento de Anneke mesclou-se a aula de interpretação em meio a luz azulada durante “Days Go By – London”, com direito a live do celular pessoal da própria frontwoman. Já em “The Martyr And The Saint – Beirut”, van Giersbergen pareceu brincar com sua voz durante a execução da faixa. “Estou feliz de estar aqui, como vocês estão? Esta música é sobre vocês” discursou a holandesa anunciando “Freedom – Rio” em meio ao público com mãos para o ar durante quase toda canção. O alcance vocal de Anneke era classificado no passado como soprano, porém com o passar dos anos, seu registro caiu um pouco – nas palavras da mesma, pela idade e por falta de tempo para treinar –, o que a levou para a classificação de mezzo soprano. O interessante fora que, mesmo com um alcance vocal de classificação semelhante à de Charlotte Wessels e 14 anos mais de velha – 46 a 32 –, notou-se ao vivo que em notas mais altas que Anneke parece possuir uma potência maior se comparada a frontwoman do Delain além de manter uma constância mais técnica no emprego de sua voz em contraste com a presença de palco energética da cantora da co-headliner da noite. Cada qual a sua maneira, brindaram os presentes com atuações primorosas.
A apresentação seguiu com a faixa “Fallout” do Devin Townsend Project, presente no álbum ‘Z²’ de 2014. Já em “Your Glorious Light Will Shine – Helsinki”, Johan van Stratum e seu baixo comandaram a energia da música enquanto Ed Warby literalmente destroçava o bumbo de sua bateria. A banda deixou o palco rapidamente e logo retornou em meio aos gritos de “VUUR, VUUR” do público; Anneke por sua vez ensinou os presentes a pronunciar o nome da banda, antes de agradecer a plateia, ao Delain e anunciar “Reunite! – Paris”, mais uma do debut de 2017, faixa para acalmar e hipnotizar o público, em meio a interpretação ímpar de Anneke acompanhada do trio de cordas.
Estando o horário avançado – menos de trinta minutos para fechamento das estações de Metrô da cidade, por exemplo –, van Giersbergen comentou que executariam apenas mais uma música, e finalizou dizendo “ouçam isso” apontando para a guitarra: era o momento para mais uma faixa da clássica banda The Gathering, “Strange Machines” presente no álbum ‘Mandylion’ de 1995, com público apreciando o encerramento da noite às 23h43m e banda bangueando no ritmo dos riffs de guitarra mesclados ao sample de teclado. Com uma agenda agitada entre projetos e participações especiais em turnês, a cantora holandesa finalmente trouxe ao Brasil sua bem-conceituada banda VUUR, e mesmo com apenas um lançamento de estúdio, o grupo que gira em torno da figura de Anneke possui um repertório amplo o qual pode enveredar tanto por faixas não executadas do próprio debut, quanto por momentos acústicos enfatizando a maestria vocal de van Giersbergen ou mesmo canções do Devin Townsend Project, The Gentle Storm e obviamente, The Gathering – ausência sentida do teclado ao vivo, menção seja feita –, versões de clássicos do rock, enfim: o céu é o limite em se tratando da mítica vocalista holandesa. Agradecimentos à Dynamo Produções, Honosounds e TRM Press.
Set List VUUR:
Time – Rotterdam
On Most Surfaces (Inuït) (The Gathering cover)
My Champion – Berlin
The Storm (The Gentle Storm cover)
Days Go By – London
The Martyr And The Saint – Beirut
Freedom – Rio
Fallout (Devin Townsend Project cover)
Your Glorious Light Will Shine – Helsinki
Reunite! – Paris
Strange Machines (The Gathering cover)