Texto por Arony Martins – Fotos por Nem Queiroz – Edição por André Luiz
Dando sequência aos side shows do Maximus Festival, o público carioca – assim como dois dias antes – teve a oportunidade de assistir mais duas bandas que foram escaladas para compor o line up do evento. Se na quarta-feira, o Vivo Rio recebeu Hatebreed e Five Finger Death Punch, dessa vez a mesma casa foi palco para duas apresentações que podemos, sem sombra de dúvida, classificá-las como históricas. Tanto Rise Against quanto Prophets Of Rage, os quais jamais estiveram em solo carioca, trouxeram peso, belos arranjos e muita reflexão ao bom público que compareceu à tradicional casa de shows do Rio.
Para quem achava que o público da noite seria predominantemente formado por fãs do Prophets Of Rage, se enganou, e diria por muito: já na entrada era possível perceber a presença de inúmeros fãs “fardados” com camisetas do Rise Against. E tudo isso se confirmou quando os primeiros acordes de “Ready To Fall” foram tocados. O público entoou cada uma das canções do curto set apresentado (11 músicas) com força tamanha que a impressão que se tinha era que havia o dobro de pessoas nas dependências da casa de shows. Cantando, acompanhando as melodias com palmas, respondendo prontamente aos chamados do simpático e competente vocalista Tim McIlrath, algo diria comovente visto que para muitos, ver os cinco rapazes – que em 1999 fundaram o grupo na distante Chicago – era a verdadeira realização de um sonho.
Mesmo que o estilo carregado pela banda como identidade (punk rock / hardcore) não exija tanto tecnicamente dos músicos, e suas canções normalmente beirem a simplicidade, o Rise Against trouxe ao Rio um repertório recheado de canções com arranjos de enorme criatividade, muito bem elaborados e com uma execução ao vivo ímpar. Por diversos momentos era possível perceber a banda flertando com o Hard Rock e até mesmo com o Heavy Metal, como em “The Violence” e na ótima “Help Is On The Way”.
A interação da banda com os fãs presentes mostrou o quanto foi importante para o grupo trazer seu trabalho para um público que jamais tivera a oportunidade de vivenciar suas canções ao vivo, empolgação tamanha que durante “Give It All”, Tim se juntou aos presentes e da grade de proteção cantou com todos em um momento festivo que, seguramente, emocionou a todos. Com uma apresentação soberba, o Rise Against dispensou maiores classificações. Em um show que não teve um ponto baixo sequer, a banda manteve seu público ainda mais fidelizado e certamente agradou àqueles que visitaram o Vivo Rio com o objetivo de assistir o Prophets Of Rage.
Set List Rise Against:
Ready To Fall
The Good Left Undone
Re-Education (Through Labor)
Satellite
The Violence
Help Is On The Way
Give It All
I Don’t Want To Be Here Anymore
Prayer Of The Refugee
Audience of One
Savior
Alguns minutos de intervalo e eis que adentrou ao palco aquele que ficaria responsável pelas honras. Quando DJ Lord, iniciou a apresentação de uma série de sequências que envolveram grandes nomes do rock em todos os tempos, estávamos diante da senha para momentos transcendentais. Não demorou muito para que Tom Morello, Tim Commerford, Chuck D, B-Real e Brad Wilk com seus punhos levantados e cerrados dessem início a uma impactante e memorável apresentação que contou em seu set com grandes clássicos do Rage Against The Machine, Public Enemy e Cypress Hill.
De cara, com a música que deu nome ao grupo, já foi possível ter uma ideia do que viria nas quase duas horas seguintes. Aliás, o novo arranjo que esse clássico do Public Enemy – gravado para o não menos clássico álbum ‘It Takes A Nation Of Millions To Hold Us Back’ – teve a felicidade de ganhar, o transformou em um verdadeiro petardo, difícil de mensurar. Algo semelhante também ocorreu em “How I Could Just Kill A Man” do Cypress Hill.
Foi exatamente nesse primeiro momento em que Tom Morello, como de costume, compartilhou com o público presente seus críticos posicionamentos políticos. O guitarrista levou o público ao delírio ao mostrar-lhes um pequeno cartaz com a inscrição “Fora Temer” colado em seu instrumento. A veia de criticidade em torno, principalmente, de questões que envolvem a opressão dos Estados e suas elites em relação aos trabalhadores e aos mais pobres, sempre foi característico no trabalho dos três grupos que se uniram para a formação do Prophets Of Rage. Seus posicionamentos ideológicos jamais entraram em contradição com aquilo que foi proposto desde o início de suas carreiras. E se o pequeno cartaz pedindo a saída do atual e controverso presidente da república brasileira chamou a atenção da grande maioria, fica aqui a torcida para que outras duas, das muitas causas trazidas ao palco pelo grupo também tenham sido. A primeira delas, estampava a camisa de Tom, e se tratava da campanha para a libertação de Rafael Braga, um morador de rua preso nas manifestações de 2013, portando uma garrafa de detergente e recentemente condenado à onze anos de prisão por tráfico de drogas e associação para o tráfico, em um julgamento pra lá de questionável – o único preso a ser condenado, em todo o país, em função das referidas manifestações. A segunda se relaciona com a inscrição em uma de suas guitarras que dizia “Arm the Homeless”, que se trata de uma campanha que visa a proteção dos sem-teto, profundamente reprimidos e negligenciados pelo Estado e sociedade estadunidense.
Muito curioso foi observar a presença de um fã, bem próximo ao palco, com um cartaz dizendo “#backzack”, em uma clara alusão ao vocalista original do RATM, Zack de la Rocha. Curioso, pois por mais que quase toda a atmosfera do hoje Prophets Of Rage gire em torno da antiga banda de Zack – o repertório escolhido fala por si só –, essa primeira fase de apresentações da nova banda, em nada aparenta ter os rappers Chuck D e B-Real como substitutos. Muito pelo contrário. Se o RATM trouxe para o rock o rap como influência, promover o encontro dos líderes dos maiores grupos do gênero com o grupo que ousou em associar dois gêneros que aparentemente viviam distantes, nada mais foi do que uma grande celebração desse estupendo casamento que se iniciou nos primeiros anos da década de 1990.
Com uma presença de palco marcante, a banda fez com que os presentes não parassem de pular um minuto. A cada clássico como “Testfy”, “Guerrilla Radio”, “Bombtrack”, “Bulls On Parade”, “Seven Nation Army” e a derradeira “Killing In The Name”, foi muito difícil permanecer imóvel. A empatia entre fãs e banda era algo incrível de se ver. Durante um medley que reuniu grandes músicas de Public Enemy e Cypress Hill, Chuck D e B-Real cantaram junto com o público, fazendo questão de cumprimentar o máximo de fãs que fosse possível. Inclusive a simpatia dos dois foi algo realmente cativante, algo mais mais evidente quando durante “Kick Out The Jams” (cover da banda MC5), tanto o vocalista quanto o guitarrista do Rise Against acompanharam a banda, arrancando sorrisos dos presentes.
Esperar por mais de vinte anos para assistir as músicas do RATM executadas ao vivo, seguramente valeu a pena. Demorou, mas de certo valeu. De quebra foi possível assistir membros de duas das maiores bandas de Hip Hop da história, assim como o embrião do vindouro primeiro trabalho do Prophets Of Rage, “Unfuck The World”. Entretanto um ponto é necessário de ser ressaltado. Por conta do momento político que vive o Brasil, diante de tantas questões negativas em que a sociedade brasileira vem vivendo principalmente nos últimos dois anos, a vinda de um grupo que se propõe a promover reflexões políticas aprofundadas através da música é algo bastante simbólico. E se momentos como esse nos serve para muitas coisas, que essa noite não fique somente guardada em nossa memória, mas que ela nos lembre que temos um grande compromisso com nós mesmos enquanto sociedade, lutar é algo o qual devemos ter como prioridade, e nesse feliz episódio coletivo estivemos muito bem acompanhados. Agradecimentos à Move Concerts e Midiorama pela produção do evento e credenciamento de nossa equipe.
Set List Prophets Of Rage:
DJ Lord Intro
Prophets Of Rage
Testify
Take The Power Back
Guerrilla Radio
How I Could Just Kill A Man
Bombtrack
People Of The Sun
Fight The Power
Hand On The Pump / Can’t Truss It / Insane In The Brain / Bring The Noise / I Ain’t Goin’ Out Like That / Welcome To The Terrordome / Jump Around
Sleep Now In The Fire
Bullet In The Head
The Party’s Over
Know Your Enemy
Unfuck The World
Seven Nation Army
Bulls On Parade
Kick Out The Jams
Killing In The Name