Entrevista por Clovis Roman – Imagens por Divulgação & Clovis Roman – Edição por André Luiz
O baterista Igor Cavalera (atualmente no Cavalera Conspiracy), esteve em Curitiba para mostrar na Vox seu trabalho voltado para a música eletrônica, o MixHell. Antes da apresentação, Igor recebeu o repórter Clovis Roman no saguão do hotel para um rápido e agradável bate papo sobre seus trabalhos atuais.
Também foi conversado sobre o novo disco do Cavalera Conspiracy (banda que leva ao lado do seu irmão, Max Cavalera), Pandemonium, e claro, em se tratando de Curitiba, relembrou-se o histórico show do Sepultura na Pedreira Paulo Leminski, ao lado do Ramones (1994).
Clovis Roman – O público que consome o som do Mixhell é o mesmo que consumia o Sepultura e agora o Cavalera Conspiracy? Você sente diferença entre os públicos?
Igor Cavalera – Tem diferença pra caralho. Nunca foi a minha pegada de forçar, tá ligado? Até mesmo com o lance da minha história… Por exemplo, o Suicidal [Tendencies] colocava o Infectious Grooves para abrir. Nunca rolou o lance do Mixhell abrir pro Cavalera [Conspiracy], ou até mesmo tocar junto. São coisas bem diferentes, que em algum lugar podem se encontrar. Não é a intenção fazer um projeto eletrônico voltado para o público do Sepultura ou do Cavalera. É uma outra pegada. Logicamente tem gente que vai curtir, vai achar legal o que tá rolando, e tem um monte de gente que não. Algumas pessoas conseguem curtir os dois, outras não, e pra mim isso é legal. Não faço nada para agradar todo mundo, nunca foi esta a idéia.
Clovis – O público metal é fanático, até mesmo obsessivo, busca autógrafos e contato físico com seus ídolos. Qual a relação desses com a galera que curte o som eletrônico?
Igor – Quando comecei a tocar com o Mixhell, não era uma coisa tanto do cara ver você, e ver qual era a baqueta que você usava… O fã de música eletrônica, principalmente a música eletrônica mais experimental, não David Ghetta, esses caras que tocam em estádios, tem uma coisa muito mais ligada ao som do que a imagem do artista. Isso me atraiu muito no começo. Muito legal entrar no clube em Berlin pra tocar, e neguinho nem sabia quem eu era. Eu entrava na cabine, tocava o som, ia embora, e os caras nem sabiam qual artista estava tocando. O pessoal ali estava buscando ouvir música, e não muito ligado no nome do artista.
Clovis – Qual foi o momento que você decidiu seguir nesse caminho da música eletrônica?
Igor – Não teve um momento que eu falei “é isto”. Desde a época do Sepultura já tinha interesse em buscar coisas novas, em samplear, coisas industriais, como o Ministry, com o qual chegamos a fazer uma turnê. Isso sempre foi uma coisa legal, e eu tentei incorporar de uma forma que coubesse tanto no Sepultura quanto no Nailbomb, de usar esses elementos de música eletrônica num som orgânico. O lance de eu sair do Sepultura calhou com o começo dos meus DJ sets. Quando eu estava no Sepultura, eu fiz alguns Dj sets, e quando sai da banda, eu fiz mais alguns. Depois de uma festa que eu toquei com a Laima [Leyton, esposa e parceira de Mixhell], aí eu pensei ´”é isto aqui, não quero fazer isto sozinho”, e então acabou virando o que é o Mixhell.
Clovis – Vocês lançaram o álbum Spaces em 2013. Como foi o processo de criação do disco, como funciona essa questão na música eletrônica? É diferente de como é feito, por exemplo, no Cavalera Conspiracy?
Igor – É muito diferente. Só posso falar pelo que a gente fez, não pela música eletrônica em geral. É muito louco. O que eu fazia com o Sepultura e faço com o Cavalera Conspiracy é muito mais orgânico em termos de escrita e composição, e depois captar aquilo [que foi criado], e depois ao vivo tentar fazer parecido. Já no Mixhell é quase um processo inverso. Eu tenho algumas idéias, entro no estúdio com a Laima, e aí começamos a fuçar e desmembrar uma música, e vai colocando elementos até virar uma outra história. Não tem tanto a coisa do ensaio ou fazer uma jam. São várias ideias que vou coletando, que a Laima vai fazendo nos “synths”, e acaba virando um som. O Spaces veio em cima disso. Convidamos algumas pessoas para participar, como o Greg Puciato, do The Dillinger [Escape Plan] e o Drumcorps, lá de Boston, uns caras que a gente acha legal na cena, para compor o disco.
Clovis – O novo disco do Cavalera Conspiracy está mais “brutalizado” que os anteriores. Essa violência toda foi proposital?
Igor – A maior cagada é quando você tenta vender um peixe e esse peixe não tá pronto, a gente virar e falar “vamos fazer o disco mais pesado e foda do mundo”, e aí quando faz não é isso. Cria uma expectativa meio errada. A gente sentou para fazer o disco [Pandemonium], eu e meu irmão, e ele tinha umas bases e eu umas ideias. O que deu o clique para o álbum sair mais forte, mais porrada, foi que as três primeiras músicas que gravamos eram músicas rápidas, meio old school. Depois dessas três, eu sentei com ele e falei para continuarmos nessa “vibe”. Fomos buscar nas demos e coisas já escritas, só as coisas rápidas, e aí quando a gente viu o disco inteiro estava nessa “vibe”. Não foi planejado antes, aconteceu no estúdio mesmo.
Clovis – E quais foram essas três primeiras músicas…
Igor – Eu nem lembro qual foi a primeira… Uma das três primeiras foi com certeza a que dá nome ao disco. Era pra eu ter ficado duas semanas no estúdio, mas em uma semana eu já tinha finalizado. Foi bem legal fazer esse disco, foi divertido. E também fazer esse disco com o John Gray, um cara que a gente acha legal o jeito de trabalhar, já fez Ministry e várias coisas que a gente acha legal, e deu no que deu. A gente fez meio que um aperitivo aqui em Curitiba do que vai ser mais ou menos a turnê, que vai ser do caralho, a gente poder misturar o que a gente fez com as coisas antigas.
Clovis – Em 1994, O Sepultura tocou com o Ramones na Pedreira Paulo Leminski, em Curitiba. Quais são suas lembranças desse show e da turnê?
Igor – Foi uma das turnês mais fodas que a gente já fez. Já tocamos com Ministry, Pantera, várias bandas, mas aquela tour com o Ramones foi muito especial. Eu e meu irmão sempre gostamos de Ramones desde moleque, e de repente, estávamos fazendo uma turnê conjunta com eles, a “Acid Chaos”, de Acid Eaters [o disco do Ramones na época] e Chaos A.D. [do Sepultura]. Eramos co-headliners. Todo dia o Joey [Ramone, vocalista do Ramones] dedicava uma música pra gente. Para muitos, o que o Beatles representa, para mim e meu irmão é o Ramones, esses eram os caras fodas no Rock. O show na Pedreira foi muito louco, a gente começou a tocar e começou a chover muito mano, muito forte, absurdo. Quando demos a última nota, parou a chuva. O Ramones entrou e não tinha mais chuva nenhuma. Foi meio apoteótico. Umas horas eu olhava pro meu irmão e falava “Vou tomar um choque aqui, vai ser foda”. Foi histórico pra gente, principalmente o daqui [Curitiba], por conta dessa coisa meio “a gente não sabia o que ia rolar”. Os caras [da produção] vinham e perguntavam “vocês querem continuar?”. E a gente “tá do caralho, vamo embora”. Quem viu, viu, quem não viu, nunca mais.
Agradecimentos à Ottavio Lourenço (Choke), por viabilizar a entrevista e pela atenção; além de Ulisses Rodrigues e Luis Carlos de Santana (hbf666.com), pelas fotos e filmagem.
No mesmo dia, Igor e Laima gravaram uma participação no Estúdio Showlivre, que pode ser conferida logo abaixo.