Texto e fotos por Clovis Roman
Sediado em Joinvile, Santa Catarina, o Armageddon Metal Festival cumpriu com sobra toda a qualidade que vinha sendo divulgada, não apenas musicalmente como na estrutura oferecida ao público. O Expoville está localizado na entrada da cidade, e é um parque com um centro de convenções no meio. Ali aconteceram os shows, em dois palcos colocados lado a lado, o que agilizou a troca de equipamentos das bandas. Enquanto uma tocava, a outra preparava tudo ao lado.
Pouco após as 13h as bandas Acefalia e Sodamned começaram o evento, pegando ainda um público tímido, tanto em quantidade quanto em agitação. A primeira mandou um Death/Grind rápido, porém com excelentes passagens, guitarras lentas e blast-beats, como notável em “Tudo É Questionável”. A segunda, mais voltada ao Death Metal com pegadas Black, também mostrou competência, com músicos e composições muito técnicas. Destaque para o baixista Felipe Gonçalves.
O Dying Breed, banda nova, que lançou apenas uma demo até o momento (com parcos 13 minutos), colocou algumas covers para completar o seu tempo sob o palco. O Death Metal básico do grupo funciona bem ao vivo, mas necessitam logo de material suficiente para um set completo. Os veteranos do Rhestus foram a segunda atração do palco Armageddon, e tocaram músicas de todas as suas fases, incluindo sons de seu último álbum (que já não é tão novo assim), Games Of Joy … Games Of War, como “Fuck Off!” (esta a banda já tocava ao vivo desde 2006, portanto, tem 8 anos). Com exceção do guitarrista e vocalista Alex Fantasma, o grupo está totalmente reformulado, mas não perdeu em nada sua força.
As duas bandas paranaenses do cast se apresentaram em sequência. Primeiro, o Doomsday Ceremony, que mandou um set curto, focado em suas composições mais recentes. E elas mostram que a banda manteve o alto nível dos primórdios, sendo que pelo menos duas delas já podem ser consideradas clássicos: “Black Heart” e a estupenda “Vultures Of War” (esta, já não tão nova, pois saiu na reedição do disco Apocalyptic Celebration, em 2008). Já o Necrotério foi uma podreira só, no melhor sentido da palavra. A banda, que ganhou muito com a volta do vocalista Mano (ex-Hecatomb e Imperious Malevolence), abriu – como sempre – com “Dying Inside Of Death”, e daí pra frente, só paulada, com as melhores composições de seus dois discos de estúdio. No meio, ainda tivemos algumas covers e uma composição mais recente, “Psycho Murder”, que encerrou o massacre.
O Expurgo, banda de grind, com rápidas músicas em profusão, abriu as primeiras rodinhas de quebração do evento. Mesmo com excelentes bandas tendo tocado antes, o grupo mineiro foi quem arregaçou mesmo, mandando 18 músicas em pouco mais de meia hora de apresentação. A dobradinha “Purging The Phlegm” e “Sofrer em Paz” (ambas do único disco do grupo até agora, Burial Ground), foram um dos inúmeros destaques. E a falta de um baixista não pesou contra.
Como o festival aconteceu em um local extremamente grande, o movimento de pessoas, tanto na pista quanto no resto das dependências era proporcional. Muitos saíam para fumar um cigarro ou comprar suas cervejas (extremamente barata, inclusive), além de passear pelo parque. Mas os shows não pararam, e os paraguaios do Kuazar mostraram a imensa evolução do começo de carreira (a banda foi fundada em 2002), já que as músicas mais novas são muito melhores. Show violento, com recepção moderada do público. O Infamous Glory veio a seguir, no palco Opa, e fez um dos melhores shows da noite. A banda encontra-se divulgando o álbum Bloodfeast, lançado ano passado, uma verdadeira pedrada, refletida na apresentação dos paulistas, além de uma música da primeira demo, The Ritual Of Black Magic, chamada “Heresy”. Eles entraram por último no cast, no lugar do The Black Coffins, que encerrou as atividades algumas semanas antes do evento. Melhor troca, impossível.
O Anthares propiciou uma autêntica viagem no tempo, afinal, foram diversas músicas do único disco da banda até agora, No Limite Da Força, lançado há longínquos 27 anos, como “Vingança”, “Fúria”, “Chacina” e a faixa-título. Houve espaço também para composições novas, como “Canibal”, tão boa quanto as antigas. Outra experiência similar veio com o set do MX, veterana banda de Thrash que voltou a ativa recentemente. Sem material novo, eles dividiram o repertório de 11 músicas entre os clássicos Simoniacal (88) e Mental Slavery (90), o mais puro Thrash Metal nacional. O destaque, apesar do arregaço como um todo, ficou com a esplêndida “The Guf” e com a saideira “Dirty Bitch”. A banda prometeu um novo disco com regravações ainda para o mês de maio.
O Black Metal do Mortuary Drape chamou positivamente a atenção da galera. Era visível que boa parte dos presentes não conhecia a banda, mas estes logo entraram no clima macabro de verdadeiros hinos como “Mortuary Drape” e a sorumbática (apesar das partes rápidas) “Tregenda”. Do último álbum, Buried in Time – e lá se vão 10 anos – vieram “Ectoplasm” e “Who Calls Me”. O cansaço começava a tomar conta da galera, mas muito headbanging foi visto durante o set dos italianos. Cerca de 21h30m, um dos grandes nomes da NWOBHM, o Grim Reaper subiu ao palco disposto a fazer seus fãs chorarem. Afinal, a trinca que abriu o show foi justamente idêntica a abertura do disco Rock You To Hell, de 1987: “Rock You To Hell”, “Night Of The Vampire” e “Lust For Freedom”. Não importa se a banda é composta atualmente por músicos contratados pelo chefão Steve Grimmet. O que conta é a qualidade inegável das composições, além do gogó do vocalista, que continua cantando absurdamente bem. Basta ver (ou ouvir, no caso) o que ele fez em clássicos atemporais como “Fear No Evil” (lágrimas, novamente) e a surpresa “Final Scream” (incluída de última hora). Ainda tivemos uma homenagem ao cantor Dio, com “Don´t Talk To Strangers” e “See You In Hell”, que encerrou o set.
Uma das coisas bacanas do festival foi a variedade de estilos. Apesar de termos várias bandas mais voltadas ao Death, houve espaço para o Grindcore, Thrash, Black e Metal tradicional. E quando a programação voltou ao Death Metal, nada melhor que um dos maiores nomes do estilo no mundo: nossos conterrâneos do Krisiun. O show, um massacre do começo ao fim, balanceou bem composições antigas, voltadas à brutalidade e velocidade, como as mais novas, nas quais a banda abriu concessões para passagens mais cadenciadas (e por consequência, mais fáceis de lembrar). Do ótimo e mais recente álbum, The Great Execution, tivemos “The Will To Potency”, “Descending Abomination” (riff aniquilador) e “Blood Of Lions”. Outro momento marcante foi a devastadora “Ravager”, que define o termo “brutalidade”. Para o final, a banda mudou o setlist, e mandaram “No Class”, do Motorhead e “Onminous”.
O Voivod nunca foi uma banda de fácil assimilação, e não seria ao vivo que as coisas mudariam. O grupo mostrou ao vivo muita originalidade e técnica aliada a carisma e humildade. O set da turnê sul-americana apresentou várias faixas do novo álbum Target Earth (o primeiro sem alguma contribuição do guitarrista Pyggy – Denis D’Amour – , morto em 2005), bem como os clássicos Unknown Knows e Voivod. Fiquei surpreso em ouvir algumas músicas mais antigas que foram incluídas recentemente ao set list como “Forgotten In Space” do Killing Technology e “Chaosmongers” (esta, ao lado de “Tribal Convictions” – que teve seu clipe bastante veiculado pela MTV Brasil na década de 90, no programa Fúria Metal – foi um dos destaques) do álbum Dimension Hatröss, de 1988! Justamente pela complexidade sonora do Voivod, muita gente saiu no decorrer do show para descansar. E estes perderam um momento histórico, afinal, esta foi a primeira visita da banda canadense ao Brasil em mais de 30 anos de carreira. Para encerrar este show pouco convencional – e igualmente genial – eles mandaram uma ótima versão para “Astronomy Domine”, do Pink Floyd, que define bem a mistura Thrash-Prog espacial do Voivod!
E por fim, a 16ª e última banda do festival subiu ao palco, 1h da madrugada de domingo. Os também canadenses do Kataklysm não se importaram com o cansaço generalizado da galera, e mandaram ver um show com 60 minutos de duração. Este foi o último show da banda no país, como parte da turnê de divulgação de Waiting for the End to Come, lançado em 2013. Comparando com o que eles tocaram nas outras apresentações, a surpresa ficou por conta da destruidora “Let Them Burn”. O vocalista Maurizio Iacono interagiu bastante com o público, que aos poucos ia deixando as dependências do Expoville Convention Center. O final ficou com a dobradinha “In Shadows And Dust” e “Crippled And Broken”.
O festival, como um todo, foi um grande sucesso. O público poderia ter sido maior – o grande tamanho do local permitia o fácil trânsito da galera para todos os lados – mas certamente ficou a anos luz de ter sido decepcionante. A ideia dos palcos paralelos foi muito boa, e para os mais fortes, foi um deleite ouvir mais de 12 horas de pancadaria das boas, quase sem intervalos. Os produtores já confirmaram que em 2015 vai rolar a segunda edição do evento. Portanto, todos os headbangers já devem colocá-lo na agenda desde agora. Foi um dia memorável para o Metal.
Agradecimentos: Kenia Cordeiro, pelo auxílio no trabalho de cobertura; Guto Diaz pelo “help” em relação ao Voivod; e a dupla Hamilcar Zaim e Nadia Gritte pelo cordial atendimento à imprensa.
Vídeos:
Anthares – Fúria
Mortuary Drape – Tregenda
MX- The Guf
Grim Reaper – Fear No Evil