Black Sabbath, Megadeth – 11/10/2013 – São Paulo (Campo de Marte)

10226334476_12cd576278_cTexto por André Luiz – Fotos por M.Rossi e Marcos Hermes (Time For Fun)

Pela primeira vez o Brasil teve a oportunidade de receber a versão mais próxima possível do Black Sabbath original. Excursionando mundo a fora com a tour Reunion promovendo o álbum “13”, Ozzy Osbourne, Tony Iommi e Geezer Butler desembarcaram no Campo de Marte em São Paulo para o segundo show no país (o primeiro ocorrera dois dias antes em Porto Alegre), e ao lado de Tommy Clufetos, proporcionaram aos cerca de 70 mil presentes uma noite nostálgica, iniciada por uma performance primorosa do Megadeth e com situações inconvenientes na entrada e saída do público.

O local escolhido, Campo de Marte, possue uma localização privilegiada na região norte de São Paulo, próximo a Marginal Tietê e a linhas de metrô, porém mesmo uma região tão bem localizada pecou na questão estrutura para recebimento das 70 mil pessoas as quais transitaram pelo local. Embora houvesse um trabalho específico da Polícia Militar garantindo a segurança do público, faltou a presença efetiva da CET com faixas e/ou placas de sinalização indicando para motoristas e usuários do transporte público o trajeto adequado. Da mesma forma, embora o evento tenha encerrado às 23h, o Metrô não soube armar um esquema adequado para receber um contingente tão elevado de pessoas no horário, optando em um primeiro momento ao acesso restrito do público as estações e posteriormente ao seu fechamento sob a alegação de “evitar vandalismo” (PS.: durante a semana ocorreu coletiva de imprensa anunciando o festival Lollapalooza e houve uma grande clemencia pela utilização do transporte público, incluindo fotos do líder do Jane’s Addiction atravessando catraca de estação da CPTM; como ocoreu situação semelhante na apresentação do Iron Maiden no Autódromo de Interlagos anos atrás, no lugar da T4F – produtora do evento – eu repensaria seriamente esta situação). Já em se tratando do Campo de Marte em si, fora montada uma estrutura especialmente para este evento contendo postos com variedade de alimentação, banheiros, postos médicos e saídas bem distribuídas e dimensionadas, porém deve ser considerada para eventos futuros a hipótese de chuva e a possibilidade da pista nos trechos com gramado se tornar um verdadeiro lamaçal.

O público especificamente falando sobre faixa etária pode-se dizer que possuiu um percentual próximo de 65% acima dos 30 anos, um clima de realização de sonho podia ser visto nos olhos de boa parte dos presentes, afinal de contas, se tratava da primeira tour dos precursores do heavy metal com sua formação 75% idêntica a de 45 anos atrás, quando o Black Sabbath nasceu na cidade inglesa de Birminghan. Habitualmente em shows deste tipo ocorrem as “amizades de uma noite”, mas em se tratando de uma banda com tamanha história e em virtude da faixa de idade do público, o nível de respeito estava mais elevado do que o de costume.

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Já passavam das 19h30m, muitos entoavam vaias a alguns anúncios comerciais e vídeos de segurança exibidos nos telões à exaustão, as luzes se apagam e um vídeo de introdução convoca a atenção dos presentes para o palco. Embora a expectativa pelo Black Sabbath fosse enorme, Mustaine e cia. possuem um legado construído em 30 anos de trajetória o qual não pode ser ignorado. Iniciando um set curto mas destruidor com Hangar 18 e Wake Up Dead, destacou-se desde o início a presença de dois telões ao lado da bateria exibindo imagens as quais se misturavam com a dos próprios músicos no telão principal ao fundo do palco, um efeito de imagem simples porém executado com maestria. Clássicos se repetiam em meio a frieza corriqueira de Mustaine contrastada com a resposta em alto e bom som do público: In My Darkest Hour, She-Wolf… Porém o volume e intensidade vindo da pista se faziam tão marcantes que em dado momento durante Sweating Bullets pode-se notar que Mustaine pareceu se empolgar pela energia da platéia.

Seguiram Kingmaker (única do último álbum presente no set e com uma recepção mais morna pelos presentes) e o petardo Tornado Of Souls, já Symphony Of Destruction fora caso a parte, o coro de “me-ga-de-th, me-ga-de-th” ao ritmo do riff marcante ecoavam pelo Campo de Marte, e após ser ovacionada a banda pausa para água. David Ellefson retorna primeiro e após soltar um “e aí São Paulo”, executa a introdução do petardo Peace Sells, mais um clássico cantado a plenos pulmões pelos presentes que arrancou sorrisso da cara carrancuda de Mr. Mustaine. A banda deixa o palco, e ao coro de “Megadeth, Megadeth”, Dave retorna e pasmem, esbanja simpatia, sorrissos, toma o microfone e discursa “Vocês estão bem? Ouvi vocês cantando e sinceramente: São Paulo tem as pessoas mais barulhentas da tour”. Não era preciso mais nada para se ganhar a noite? Errado, os demais integrantes juntam-se ao frontman para execução do clássico Holy Wars… The Punishment Due, encerrando a curta (em se tratando do vasto repertório do Megadeth) mas precisa e marcante apresentação da banda.

Impressões pessoais, além da qualidade do som vindo dos PA’s (instrumentos nítidos e voz de Mustaine totalmente audível exceto em Kingmaker), o retorno do baixista fundador David Ellefson foi ótimo para a banda, assim como o guitarrista ex-Nevermore Chris Broderick desfila técnica e precisão nos solos arrementendo aos bons tempos de Friedman, já Shawn Drover tratou-se do jogador que não inventa em campo e faz o “feijão com o arroz” em uma linguagem de futebol. Mustaine por outro lado, parece que gostou do que viu, embora sua técnica e precisão permaneçam em alto nível muito se questiona sobre a frieza demonstrada em palco, como presenciei em shows passados da banda no Credicard Hall ou no festival SWU, mas a empolgação do público era tão marcante que mesmo o frio Dave se entregou e agradeceu veemente aos presentes.

MEGADETH
Hangar 18
Wake Up Dead
In My Darkest Hour
She-Wolf
Sweating Bullets
Kingmaker
Tornado of Souls
Symphony of Destruction
Peace Sells
Bis
Holy Wars… The Punishment Due

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Encerrada a primeira parte da noite, público se espremendo na direção do palco seja na pista normal ou premium, o foco era Ozzy Osbourne, Tony Iommi e Geezer Butler pela primeira vez juntos em São Paulo. Não é preciso citar sobre a história da banda, dizer que se hoje em dia há equipamentos de última geração e aparatos eletrônicos que contribuem para sonoridade das músicas, mas o trio citado acima ao lado de Bill Ward criaram a matriz, iniciaram o que seria o heavy metal tradicional, o doom metal, o ocultismo nas letras de death-black, os riffs thrash, tudo isto utilizando instrumentos com tecnologia nula em uma época marcada por pioneiros como Jimmi Hendrix em meio a uma cena cena britanica monopolizada por Beatles e Rolling Stones. Assistir os criadores de obras primas históricas com mais de 40 anos de existência tratava-se de experiência única para pelo menos 95-98% dos presentes que nunca o fizeram fora do Brasil.

E se a expectativa era grande, ao ouvir o próprio Ozzy entoar ainda com as cortinas fechadas um coro surpresa “ohoh ohohohohohoh” o público passou a se espremer nas proximidades do palco até o limite imposto pelas leis da física. A tradicional sirene é entoada nos PA’s do Campo de Marte, baixam-se as cortinas e lá estavam Ozzy Osbourne, Tony Iommi e Geezer Butler acompanhados pelo baterista Tommy Clufetos executando War Pigs. Levantar as mãos, bradar a letra, olhar de descrédito, as reações do público foram as mais diversas, aquela canção que por tantas vezes ouviu-se no disco vinil, fita cassete, cd ou MP3 estava sendo executada pelos seus criadores a metros de distancia. O grito ecoado no Campo de Marte era ensurdecedor, mal pôde-se ouvir o frontman anunciando Into The Void, mas o riff matador do clássico de 1971 Master Of Reality (tido como marco do doom metal) mantinha o clima nostálgico. As duas faixas seguintes arremetem o repórter em questão aos seus primórdio na música pesada, quando escutava o vinil Vol. 4, mais progressivo do que os álbuns anteriores: a reverenciada Under the Sun/Every Day Comes and Goes com o desfile técnico de Butler no baixo e um “Obrigado, Deus os abençoe” de Ozzy, mais o petardo Snowblind bradado em alto e bom som pelo público.

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O madman anuncia a primeira faixa executada do álbum 13, Age Of Reason, embora seja uma música muito boa a recepção do público acabou sendo morna, porém a sequência… Na década de 70, em uma sociedade tradicional como a britânica, lançar um álbum com atmosférica sombria encabeçada pela faixa-título Black Sabbath tornou-se repercussão imediata, mas presenciar a execução deste verdadeiro hino ao vivo pelos pais da obra é totalmente diferente. A interpretação nefasta de Ozzy arrementendo a um culto satanista, Iommi dá um passo a frente e após exibir o famoso chifrinho de DIO com os dedos, rouba a cena com uma mescla maravilhosa de riffs e solo, lá estava o repórter que vos dirige a palavra com feição de descrédito e olhos cheio de lágrimas a exemplo de alguns companheiros ao redor.

Behind The Wall Of Sleep seguiu a noite, Geezer assume o controle e introduz um solo de baixo conhecido, seria a deixa para N.I.B., bradada em uníssono. Nova pausa do público mediante faixa do álbum 13, desta vez em End Of The Beginning, e a noite prossegue com a clássica Fairies Wear Boots. Já a instrumental Rat Salad precedeu um solo de bateria interminável de Clufetos, e embora longo o público não apenas participou ativamente como presenciou o grande vigor físico do ex-integrante da banda de Rob Zombie. Fingiu encerrar e reiniciou por quatro vezes, e após estratégicos dez minutos de descanso aos sexagenários integrantes, Tommy entregra a introdução de bateria para o retorno de Ozzy-Iommi-Butler com a histórica Iron Man, mais um de vários pontos altos da apresentação, com direito a reverência de Ozzy ao público e a afirmação ao seu final “São Paulo Rocks”.

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God Is Dead? encerrou a sequência de faixas do lançamento de 2013 que alcançou o topo das paradas de todo mundo, e de longe fora a mais bem recepcionada destas pela execução em rádios locais com certa frequência. “Ahhh eu as amo” afirmou Ozzy em tom deboxado após anunciar Dirty Women, faixa a qual contou com imagens eróticas exibidas no imenso telão ao fundo do palco e um solo simplesmente ma-ra-vi-lho-so do mestre Iommi que rendeu reverencias do madman durante a magnífica execução (nota do autor: desculpe o tom interpessoal em dados momentos mas eles deram origem a tudo o que ouvimos hoje em dia, os exageros são sinceramente cabíveis nesses casos por mais profissionalismo que eu demonstre em dez anos cobrindo eventos). “Se vocês continuarem LOCOS tocaremos mais músicas” proferiu Ozzy arrancando brados do público, até Iommi assumir as rédeas com um riff conhecido, mais um clássico, simplesmente Children Of The Grave, para encerrar em alto estilo a primeira parte do show.

Com integrantes visivelmente empolgados pela energia do público a banda retorna ao palco, macada por sorrissos de Butler e Iommi, além de um Ozzy buscando no fundo das energias fôlego para continuar a “corrida” de um lado ao outro do palco e incitando a platéia com gritos de “olê olê olê olê” dando lugar ao “ohoh ohohohohohoh”. Os músicos executam a introdução de Sabbath Bloody Sabbath mas antes que inicie a parte cantada, emendam com o petardo faixa-título do segundo álbum e mais popular da banda até os dias de hoje, Paranoid. As rodas e mosh pits que permaneciam inexistentes desde as 19h30m quando Mustaine e cia. deram início a pequena maratona musical, finalmente deram o ar da graça em uma espécie de “estavamos esperando este momento a anos, banguear durante Paranoid ao vivo executada pelos integrantes originais da banda”. Nada mais nostálgico do que encerrar o set com uma das músicas mais conhecidas da história do heavy metal mundial.

Ao fim da noite, conclusões podem ser tiradas sobre os músicos em questão, sobre fase DIO melhor que fase Ozzy e vice versa, a falta sentida ou não de Bill Ward, enfim, a única certeza é que os 70 mil presentes estavam diante de um palco no qual três ícones lendários da história musical encontravam-se reunidos pela primeira vez em solo paulista em uma tour inédita no país, e que embora tenhamos aguardado 45 anos pela esperada performance, está possa ser a única vez que a mesma aconteça no Brasil. Escreveu-se uma página marcante na história do heavy metal brasileiro, a noite em que presenciamos os precursores de tudo o que podemos chamar de música pesada que já foi ouvido até hoje ali, a metros de distancia, exibindo seu talento apesar dos mais de 60 anos de idade de cada integrante, arrancando lágrimas e levando ao ecstasy um público que pode dizer um dia: eu assisti o Black Sabbath ao vivo.

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BLACK SABBATH
War Pigs
Into the Void
Under the Sun/Every Day Comes and Goes
Snowblind
Age of Reason
Black Sabbath
Behind the Wall of Sleep
N.I.B.
End of the Beginning
Fairies Wear Boots
Rat Salad
Iron Man
God Is Dead?
Dirty Women
Children of the Grave
Bis:
Sabbath Bloody Sabbath / Paranoid

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